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03 de fevereiro, 2021

O horário escolar atrapalha a qualidade do sono dos alunos. E agora?

O horário escolar atrapalha a qualidade do sono dos alunos. E agora?

Em abril de 2018, o Washington Post publicou um artigo nada sutil: “Por que é tão ridículo que as escolas comecem as aulas tão cedo pela manhã?”. O título é incisivo e gerou discussão, mas a conversa sobre o horário escolar vem de antes. O problema? Ele não é adequado ao cronotipo de pré-adolescentes e adolescentes.

É só fechar os olhos e lembrar de como era difícil pra você acordar tão cedo nos tempos de escola. Pois é, não é “preguiça de adolescente”. É biologia.

O ritmo circadiano dos jovens é mais tardio comparado ao de adultos e até mesmo de crianças. Isso quer dizer que naturalmente eles dormem e acordam mais tarde. É evidente que agentes externos, como a tecnologia, acabam deixando os adolescentes acordados até tarde, mas o próprio corpo deles também pede isso. 

O encontro do cronotipo vespertino com as aulas tão cedo é como misturar água e óleo: não dá certo. Não é à toa que pelo menos uma vez por semana 28% dos estudantes caem no sono na escola  e mais 20% também fazendo lição de casa, de acordo com a Academia Americana de Pediatria, que recomenda que as aulas comecem, no mínimo, às 8h30. Bem diferente do 7h20 adotado por muitas escolas no Brasil.

Consequências de uma noite mal dormida para adolescentes

Um sono de baixa qualidade tem consequências que todo muito conhece bem: sonolência diurna, problemas de memória e concentração, falta de equilíbrio e até mesmo consumo excessivo de calorias, entre outros.

Para os adolescentes, ele também atinge o rendimento escolar. Afinal, quem consegue prestar atenção na primeira aula do dia depois de dormir apenas um par de horas?

Outros problemas das noites mal dormidas para quem está em idade escolar são:

  • Baixo ou nulo engajamento em atividades físicas;
  • Sintomas de depressão
  • Maior propensão a se envolver em atividades de risco tais como beber, fumar ou usar drogas ilíticas.

Mas, afinal, qual é a quantidade ideal de sono para adolescentes? No Consenso publicado em 2016, a Academia Americana de Medicina do Sono determinou que o número ideal gira entre 8 e 10 horas dos 13 aos 18 anos. Ou seja, para acordar às 6h e estar em sala de aula uma hora e meia depois, eles deveriam ir para a cama no máximo às 22h00. Quem tem um adolescente em casa sabe que isso é impossível.

Em alguns lugares, leis já regulamentam o horário escolar

Mais do que apenas uma ideia ou pedido de médicos, em alguns lugares do mundo o horário das aulas virou motivo de luta e até mesmo leis.

É o caso dos Estados Unidos, onde existe a Start School Later, uma ONG que, como o próprio nome indica, luta pelo fim da necessidade de os alunos madrugarem para estudar.

“Somos uma coalizão de profissionais da saúde, cientistas do sono, educadores, pais, estudantes e outros cidadãos dedicados a aumentar a consciência pública sobre a relação entre o sono e o horário escolar e a garantir um horário de entrada compatível com a saúde, segurança, educação e equidade.“, diz o site da Organização.

A equidade entra nesse fator porque alunos mais pobres têm acesso mais dificultado ao transporte público e aos centros escolares e, portanto, precisam acordar mais cedo ainda para chegar a tempo para a primeira aula do dia. Por isso, os benefícios de um horário escolar tardio dobram para estes estudantes.

Casos de sucesso

Um dos casos mais conhecidos de sucesso da mudança do horário escolar para mais tarde é o de Seattle, nos Estados Unidos. Por lá, desde o ano letivo de 2006-2007, as aulas de middle school e high school, relativos ao Ensino Fundamental II e o Ensino Médio brasileiros, foram atrasadas das 7h50 para as 8h45. 

Dois anos depois, foi publicado o primeiro estudo com os reflexos dessa mudança nos adolescentes. Eles passaram a dormir, em média, 34 minutos a mais por noite, aumentando o sono de 6 horas e 50 minutos para 7 horas e 24 minutos. 

Eu ganhei uma hora de sono e definitivamente me sinto muito melhor. Eu agora acordo às 7h30 sem o alarme porque é um horário natural. É uma sensação ótima”, declarou a estudante Lilly Grey Rudge, à época com 16 anos em outra reportagem do The Washington Post.

O absenteísmo e a quantidade de atrasos também diminuíram, sobretudo em centros educacionais em regiões de desvantagem econômica.

Ao todo, 46 estados americanos têm (ou terão em um futuro próximo) regulamentações próprias que alteram o horário escolar. Entre eles está a Califórnia, que por meio da lei California Bill 328 de 2019, determinou que middle schools não podem começar antes das 8h00 e high schools antes das 8h30. O texto, um dos primeiros assinados pelo Governador Gavin Newsom em seu mandato, ainda especificamente encoraja escolas e a comunidade a divulgar “informações sobre as consequências da privação do sono“. 

E no Brasil?

Assim como nos Estados Unidos, no Brasil também existe um movimento crescente que pede o atraso do horário escolar para, pelo menos, 8h30 da manhã. Por aqui, assim como por lá, a organização une profissionais da saúde, da educação e pais de alunos.

“Adolescentes dormem em média 2 horas menos durante a semana  que no final de semana e por isso a mudança no horário das aulas é uma das nossas bandeiras”, explica a médica neurologista Dra. Andrea Bacelar, presidente da ABSono (Associação Brasileira do Sono).

O trabalho já começa a surtir efeito. Em Brasília, cidade em que a atuação é mais forte, três escolas já atrasaram o horário escolar. Outras estão trabalhando no modelo híbrido de horários flexíveis, para atender tanto os alunos vespertinos quanto os matutinos.

Outros benefícios da mudança no horário escolar 

Se o aumento da qualidade do sono e da saúde dos estudantes e os incontáveis benefícios de dormir bem para a educação ainda não são argumentos suficientes para ter aulas mais tarde, aqui vai outro: atrasar o horário escolar é bom até para a economia.

Uma análise com viés econômico do movimento Star School Later projetou que as aulas começando às 8h30 iriam “impactar significativamente a saúde pública e a economia americana, com benefícios que rapidamente irão sobrepassar os custos“. 

O estudo ainda calcula que em apenas dois anos a economia teria um ganho de 8,6 bilhões de dólares. Em 15 anos, esse número saltaria para 140 bilhões de dólares. Tudo isso por menos de uma hora de diferença no horário escolar.

No Brasil, o horário de aulas varia entre os estados, mas costuma variar entre 7h20 e 7h45. Com o início do novo ano letivo, talvez seja o momento de mudar isso e garantir um sono melhor para os nossos estudantes.

(Post atualizado em 10 de fevereiro)

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